A cerimônia de lançamento do Centro de Documentação de Línguas e Culturas Indígenas aconteceu no dia 20 de maio, no Museu da Língua Portuguesa – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens.

 

Por Erika Yamamoto

O Brasil é um dos países mais multilíngues do mundo. Além do português, são faladas centenas de línguas indígenas no território nacional, e muitas delas estão ameaçadas de desaparecer. Para contribuir com a realização de pesquisas, documentação e difusão da diversidade linguística e cultural dos povos indígenas brasileiros, o Museu da Língua Portuguesa (MLP) e o Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE) da USP uniram esforços e criaram o Centro de Documentação de Línguas e Culturas Indígenas.

“Língua não é só estrutura gramatical, é território, é identidade, é forma de viver e sentir o mundo. As nossas línguas indígenas guardam dentro de si as florestas inteiras, os rios, estrelas, espíritos e saberes. São 274 línguas faladas hoje no Brasil. Cada uma delas é uma biblioteca viva, uma cosmovisão, um universo em movimento. E, cada vez que uma língua indígena desaparece, o mundo perde uma forma de ser. Por isso, esse centro nasce como resistência, nasce como re-existência, nasce como semente que vai germinar conhecimento, políticas públicas, materiais pedagógicos e, acima de tudo, reconhecimento. E aqui, juntos, construímos esse grande arco de aprendizagem reconstrutiva do conhecimento”, afirmou a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, durante a cerimônia de lançamento do Centro de Documentação de Línguas e Culturas Indígenas.

Para o reitor da USP, Carlos Gilberto Carlotti Junior, “as universidades brasileiras têm a obrigação de ampliarem suas relações com os países e os povos da América Latina. Essa é uma grande oportunidade para aperfeiçoarmos o ensino e a pesquisa que desenvolvemos, com base na parceria que estamos estabelecendo com o Museu da Língua Portuguesa e com representantes das populações indígenas. Essas interações darão uma nova cara à USP e é muito importante que possamos incorporar novos conhecimentos para nos tornarmos uma universidade melhor”.

Com financiamento de R$ 14,5 milhões da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), o centro tem o objetivo de desenvolver pesquisas inéditas e se tornar referência nacional e internacional para constituição de coleções digitais de conhecimentos intangíveis e práticas indígenas, a partir de relações de confiança e respeito para com as comunidades e especialistas indígenas envolvidos.

O presidente da Fapesp, Marco Antonio Zago, explicou que, “com esse centro, estamos cumprindo a nossa obrigação de criar uma organização sólida, capaz de promover o registro, o estudo e a divulgação das culturas indígenas, incluindo o seu rico repertório linguístico. É imperativo que as diferentes facetas da sociedade brasileira estejam igualmente representadas nos nossos esforços de ciência e educação. Apesar de todas as ações passadas para a supressão da cultura indígena, a língua indígena foi o meio predominante de comunicação em São Paulo até o século XVIII, e sua influência ainda se faz presente nos dialetos caipira e paulista”.

A cerimônia de inauguração do Centro de Documentação de Línguas e Culturas Indígenas foi realizada nesta terça-feira, dia 20 de maio, no auditório do Museu da Língua Portuguesa e contou com a presença da secretária da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo, Marília Marton, além de lideranças e artistas indígenas e de autoridades na área de estudos de populações originárias.

Repositório da diversidade cultural e linguística

Resultado da parceria entre o Museu da Língua Portuguesa e o MAE, o Centro de Documentação de Línguas e Culturas Indígenas criará um repositório digital de documentos e acervos de linguística e antropologia de comunidades indígenas do Brasil e de países vizinhos. A necessidade de incentivar a produção de pesquisas inéditas sobre os povos originários foi reconhecida pela Organização das Nações Unidas (ONU), que definiu o período de 2022 a 2032 como a Década Internacional das Línguas Indígenas.

“Esse centro é uma iniciativa inovadora, sediada em dois museus, que articula pesquisa, documentação e difusão cultural, com o objetivo de fortalecer as línguas e conhecimentos dos povos indígenas, no espírito da Década Internacional das Línguas Indígenas, diante do desafio de memórias historicamente inviabilizadas que não podemos acessar, respondemos com o compromisso de plantar terreiros digitais. Queremos gerar arquivos vivos e um terreno fértil com os povos indígenas na tomada de decisões e na implementação desse projeto, somando forças com instituições, pesquisadores, museus e organizações da sociedade civil”, explicou a diretora executiva do Museu da Língua Portuguesa, Renata Motta.

A antropóloga Maria Luísa de Souza Lucas e a linguista Luciana Storto são as responsáveis pelas áreas de Antropologia e Linguística do centro, que também abrirá processo seletivo para 14 bolsistas de graduação e de pós-graduação e ainda para cinco bolsistas técnicos, com especial atenção às candidaturas indígenas.

O diretor do MAE, Eduardo Góes Neves, ressalta que “queremos incorporar, de maneira honesta e genuína, o conhecimento dos pesquisadores indígenas no processo de produção científica do nosso centro. Acreditamos que essa interação marcará um novo caminho para a Universidade, tornando-a ainda mais diversificada, interessante e produtiva”.

O centro atuará em três linhas principais de ação: pesquisa e documentação; construção do repositório digital de acesso gratuito no qual estarão armazenadas as coleções; e comunicação cultural, que se concentrará em ações de mediação intercultural e de difusão.

 

Fonte: Jornal da USP.

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