Por Vinícius Pereira

O combate ao racismo e a discriminação racial e de gênero trouxe resultados positivos à economia e, inclusive, auxiliou o desenvolvimento econômico das últimas décadas em países como o Brasil e os EUA.

Estudos realizados por pesquisadores americanos e brasileiros mostram que, graças ao início de uma mudança comportamental da sociedade, pessoas negras e mulheres passaram a ocupar cargos mais qualificados, antes negados apenas pela cor da pele ou sexo.

Essa nova ordem econômica e social, que surgiu com força no começo da década de 1950, nos EUA, fez com que o chamado capital humano se desenvolvesse. Isso aumentou a produtividade agregada e a eficiência econômica e também influenciou positivamente o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) dos dois países entre as décadas de 1960 e 2010.

Talentos desperdiçados

Uma mulher nascida nos anos 1960 e com aptidão para a Medicina teria mais dificuldades em se formar médica naquela época, por conta do preconceito e das barreiras de gênero.

Assim como era improvável que um homem negro se tornasse um advogado reconhecido na sociedade na época, por mais talentoso que fosse.

O combate ao racismo e a discriminação racial e de gênero trouxe resultados positivos à economia e, inclusive, auxiliou o desenvolvimento econômico das últimas décadas em países como o Brasil e os EUA.

Estudos realizados por pesquisadores americanos e brasileiros mostram que, graças ao início de uma mudança comportamental da sociedade, pessoas negras e mulheres passaram a ocupar cargos mais qualificados, antes negados apenas pela cor da pele ou sexo.

Essa nova ordem econômica e social, que surgiu com força no começo da década de 1950, nos EUA, fez com que o chamado capital humano se desenvolvesse. Isso aumentou a produtividade agregada e a eficiência econômica e também influenciou positivamente o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) dos dois países entre as décadas de 1960 e 2010.

Esses empregos de alta qualificação, que requerem anos de estudo e têm uma remuneração maior, eram reservados em sua grande maioria a homens brancos.

“Por causa da característica de nossa sociedade, as pessoas podem não escolher exatamente aquilo no que são boas. Se você for muito bom jogando futebol, você provavelmente vai querer ser profissional e nós queremos assistir a um bonito futebol”, disse Chang-Tai Hsieh, um dos autores do estudo e pesquisador da Universidade de Chicago à BBC News Brasil.

“Mas, caso haja alguma barreira de entrada, você talvez nem tente se tornar um jogador e acabe indo fazer algo em que você, particularmente, não é tão bom”, afirmou Hsieh. “A mesma coisa, por exemplo, acontece com os executivos-chefes (de empresas).”

As barreiras de entrada podem ser do próprio mercado de trabalho, como a discriminação na contratação de uma mulher, por exemplo, ou barreiras prévias, como a falta de acesso a uma educação de qualidade.

De acordo com os pesquisadores ouvidos pela BBC News Brasil, apesar de essas barreiras ainda impedirem que parte dos talentos seja destinada às ocupações onde elas poderiam render mais, o combate ao racismo e a discriminação de gênero vem melhorando a alocação do capital humano.

“A má alocação de capital humano é um dos reais motivos pelo qual uma sociedade é pobre”, disse Hsieh.

Não à toa, 94% dos médicos eram homens brancos em 1960 nos EUA, de acordo com o estudo, realizado em conjunto por pesquisadores das universidades americanas de Chicago e Stanford. Cinquenta anos depois, o percentual cairia para 62% — aumentando o espaço às demais raças e gêneros.

No Brasil, por exemplo, uma pesquisa da Fundação Getulio Vargas (FGV) mostra que, em 1970, 82% dos médicos, dentistas e enfermeiros eram homens. Já quatro décadas depois, o percentual caiu para 37%, graças à diminuição das barreiras em ocupações mais qualificadas.

Além disso, a participação das mulheres em ocupações de alta qualificação (médicas, advogadas, magistradas, diretoras de empresas, chefes na administração pública, etc) passou de 10% para 45% no mesmo período.

“A nova situação das mulheres no mercado de trabalho, especialmente em ocupações mais qualificadas, influenciam positivamente a produtividade agregada da economia”, disse Laísa Rachter, pesquisadora doutoranda da FGV e que comanda uma pesquisa semelhante à dos EUA.

40% do crescimento do PIB per capita

A evolução da sociedade permitiu que houvesse a queda de algumas dessas barreiras de entrada para as ocupações qualificadas. Dessa forma, quando os profissionais são qualificados e possuem mais habilidades, a economia tem a capacidade de produzir mais valor.

O resultado é que, de acordo com a pesquisa americana, entre 20% e 40% do crescimento do PIB per capita nos EUA, entre 1960 e 2010, pode ser atribuído à entrada de mulheres brancas, mulheres pretas e homens pretos em profissões mais qualificadas.

“Essa é uma combinação de uma melhor alocação de talentos entre as profissões, níveis crescentes de educação e participação crescente da força de trabalho para as mulheres em resposta às barreiras que caem”, disse Pete Klenow, PhD em economia pela Universidade de Stanford e um dos autores da pesquisa.

No Brasil, dados preliminares sugerem que o impacto é parecido com o observado no PIB americano.

“A nova situação das mulheres no mercado de trabalho, especialmente em ocupações mais qualificadas, influencia a produtividade agregada da economia. Esses movimentos podem ajudar quando eles reduzem a barreira da discriminação no mercado de trabalho”, afirmou Laísa Rachter.

Mulher estudandoDireito de imagemGETTY IMAGES
Image caption“A má alocação de capital humano é um dos reais motivos pelo qual uma sociedade é pobre”, diz especialista

O caso Sandra Day O’Connor

Um dos casos citados pelos autores do estudo americano como exemplo é o de Sandra Day O’Connor, primeira juíza mulher da Suprema Corte dos EUA, que ocupou o cargo entre 1981 e 2006.

Formada em Stanford em 1952 como uma das melhores da classe, a ex-juíza só encontrou empregos de baixa remuneração como secretária jurídica e apenas quase dez anos mais tarde, conseguiu trabalhar no meio jurídico.

Apesar de suas qualificações acadêmicas, O’Connor teve dificuldades em conseguir trabalho como advogada em escritórios privados e começou sua carreira jurídica como vice-promotora em um condado na Califórnia. Foi eleita senadora estadual e depois juíza em cortes locais, até ser nomeada à Suprema Corte.

“Se você fosse uma mulher no início de 1950, saberia que era difícil conseguir um emprego e, se fosse advogada, não deveria nem se preocupar em tentar. Você saberia que as chances para você eram zero, então por que tentar?”, explicou Chang-Tai Hsieh.

“Ela (O’Connor) era extremamente talentosa e habilidosa para a área jurídica, mas mulheres naquela época acabavam tendo que escolher fazer outra coisa”, disse o pesquisador.

Graças às mudanças sociais nos EUA desde então, atualmente, advogadas que se destacam têm mais espaço para atuarem na área em que são mais talentosas, embora muitas barreiras de gênero persistam, como licenças maternidade e paternidade e dificuldade em conciliar a carreira com os cuidados com os filhos.

“Agora as mulheres escolhem fazer faculdade de Direito porque elas sabem que têm uma chance real. Não é só sobre Direito, são várias outras ocupações ou cargos. Hoje, mulheres e negros nos EUA sabem que podem ocupar qualquer posição”, afirmou Hsieh.

Caso as barreiras continuem a cair, as economias dos EUA e do Brasil devem continuar a ser beneficiadas.

“Vemos amplo espaço para crescimento futuro se as barreiras caírem ainda mais. Em particular, estimamos que o PIB acabaria sendo 10% maior, sem barreiras. Isso equivale a cerca de uma década de crescimento do PIB por trabalhador”, disse Pete Klenow.

Fonte: BBC Brasil | Imagens: Getty Images.

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